Traduzir: Jean Laplanche e Haroldo de Campos - Núcleo de Psicanálise, Cinema e Vídeo
Resumo
O vídeo Traduzir, realizado em 1993, é o registro valioso e raro de uma conversa memorável entre Laplanche e Haroldo de Campos. Grandes mestres, o psicanalista e o poeta desafiam-se como se diante de um tabuleiro de xadrez onde o tema da tradução derruba reis, rainhas e encalacra peões. Instigados pelas próprias excelências, abandonam suas torres, trançam conhecimentos e nos colocam frente a frente com o processo de criação. Laplanche se expressa de forma tão incisiva diante das proposições haroldianas que seus tradutores – após acesso ao material num colóquio em Cerisy, na França, em 2014 – disseram que teriam conduzido os trabalhos por outro caminho, se tivessem visto o vídeo antes. O reconhecimento tardio da importância desse encontro nos leva a refletir – psicanalistas que somos – sobre períodos de latência e vicissitudes institucionais que o tempo e a maturidade dissipam. Bom para todos. A divulgação do vídeo Traduzir em Percurso é o desfecho de uma parceria em coprodução entre o Departamento de Psicanálise e o Núcleo de Psicanálise, Cinema e Vídeo. Sua redescoberta acontece promissoramente quando a informação circula numa velocidade quase mágica nas redes sociais e atinge um público impensável anteriormente. O Núcleo de Psicanálise, Cinema e Vídeo começou como o que são hoje chamados de coletivos – cinco jovens psicanalistas reuniram-se para estudar, trocar ideias e somar experiências: Heidi Tabacof, Maria Aparecida Aidar, Maria Lúcia Lima, Maria Marta Azzolini e Maria Rita Kehl. Ao mesmo tempo, o cinema paulista passava por um ciclo criativo contagiante com extraordinário poder de mobilização, o que motivou a escolha do audiovisual como via para realizar o desejo de documentar, ampliar e democratizar o acesso aos intrincados temas psicanalíticos. Além disso, Maria Aparecida Aidar já havia feito o filme Mulheres da Boca com Inês Castilho, o que nos levou a uma primeira colaboração como grupo em 1983 no filme Hysterias, autoria da última. Não sabíamos ainda que o mais difícil seria aprender a trabalhar em grupo. Logo éramos quatro e durante todo o processo buscamos supervisões que foram ajuda valiosa e decisiva. Muito cacique e pouco índio, os males de um grupo são. Entremeando fizemos Psycuba em 1986 – trabalho fundador – e A Mulher do Atirador de Facas em 1989. Em 2000, lançamos o documentário Nós, outros e a psicanálise, filmado em 1995. Traduzir, de 1993, foi gerado pelo nosso grupo no evento “Jean Laplanche em São Paulo”, a partir da proposta do encontro entre Laplanche e Haroldo de Campos, feita por Ana Maria Sigal. Nesse trabalho, a direção cinematográfica foi de Heidi Tabacof, com mediação de Miriam Chnaiderman e Renato Mezan. Concluir esse vídeo em parceria, após tanto tempo, só foi possível com a participação do atual Conselho de Direção. Entregá-lo ao público através da Percurso é uma chave de ouro no obstinado trabalho de ser-coletivo. Traduzir, agora também homenagem póstuma, oferece o prazer da presença viva-virtual do mestre: seu corpo, gestos, olhar e voz. O ato da reflexão em tempo real, com seus ritmos e variações, experiência sensível que acompanha o trabalho intelectual de acordo com a tradição oral na transmissão da Psicanálise.
Tradução: Claudia Berliner