Após o fim do mundo: como se orientar no pensamento e na vida doravante?
Palavras-chave:
civilização, coisa, cuidado (cura), desejo, excesso, humano, humanismo, inumano, obscurantismo, orientar-se, trabalho (da cultura)Resumo
Se a pandemia de Covid-19 dá o tom de nossa condição presente, ela é “apenas” o último revelador da falência da civilização moderna. O “mundo desenvolvido” está enfrentando em particular uma virada regressiva sem precedente: o profundo retrocesso político, ético, civilizacional que estamos vendo e vivendo; a destruição do humano em nós. Do interior dessa falência civilizacional, a presente Nota se esforça em projetar uma resposta à questão (beckettiana por excelência): como continuar? Como se orientar no pensamento e na vida doravante, após a ruína da fé no homem, postulada pelos humanismos? Um bom guia: a correspondência entre Freud e Einstein, Por que a guerra? Ela esboça uma anamnese dos pressupostos de todo humanismo. O humano carrega constitutivamente em si “algo” que o excede e que, como tal, não é humano. Esse excesso é ineliminável; ele requer antes um “trabalho”, o “trabalho da cultura, Kulturarbeit”, um “cuidado”, uma “cura” (a cura sui). Freud abre assim a via para o que nos preocupa realmente: um pensamento do após-humanismo. E lá nós reencontraremos o seminário de Lacan consagrado à “Ética da psicanálise”. Esta Nota faz, de passagem, algumas observações sobre a delinquência de Estado que está devastando o Brasil hoje. E deixa a questão: como explicar, numa República, a inacreditável impunidade de um genocida e ecocida notório colocado no cimo do Estado, abertamente envolvido com o crime organizado? O que concluir dessa banalização do mal? E da carência de indignação consequente das forças ditas progressistas? Isso atesta a falta estrutural, nesse “aparelho psíquico” chamado “civilização brasileira”, de um verdadeiro “trabalho da cultura”. E essa falta vai perfeitamente de mãos dadas com a propensão obscurantista e fascizante do neoliberalismo mundial em crise.
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Referências
Lacoue-Labarthe, Ph. (1988). La Fiction du politique: Heidegger, l’art et la politique. Paris: Bourgois.
Einstein, A. Why war? (1932). A letter from Albert Einstein to Sigmund Freud. Unesco. Disponível em: https://en.unesco.org/courier/may-1985/why-war-letter-albert-einstein-sigmund-freud.